
Por: Léo Farias
Em 19 jun, deste ano, o principal tribunal administrativo francês manteve a penalidade de € 50 milhões (cinquenta milhões de Euros) imposta à Google LLC pela Commission Nationale de l’Informatique et des Libertés (CNIL), a Autoridade Francesa de Proteção de Dados. Tal sanção foi aplicada em 21 de janeiro de 2019, com base no General Data Protection Regulation (GDPR) por falta de transparência, informação inadequada e ausência de consentimento na personalização de anúncios. Em cotação atual, a multa aplicada é cerca de seis vezes maior do que o teto da multa simples prevista na nossa Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), Lei nº 13.709/2018.
Embora o valor da multa ainda seja inexpressivo, se comparado à receita global desta Big Tech, as mudanças em seus processos de coleta de dados de titulares podem ser necessários e podem ter consequências muito maiores no resultado final da segmentação de anúncios. E, o impacto no Vale do Silício foi imediato, já que esta multa foi a maior aplicada para tal violação. Ao ser procurada, a Google enviou a seguinte nota, através de uma porta-voz:
As pessoas esperam entender e controlar como seus dados são usados, e investimos em ferramentas líderes do setor que as ajudam a fazer as duas coisas. Esse caso não foi sobre se o consentimento é necessário para a publicidade personalizada, mas sobre como exatamente ele deve ser obtido. À luz dessa decisão, agora revisaremos as alterações que precisamos fazer.
Google LLC
De acordo com o GDPR, para que um consentimento seja realizado em base legal e válido para o tratamento de dados pessoais, o titular destes dados deve ser informado de maneira clara, específica e seu consentimento deve ser fornecido por espontânea vontade. Em outras palavras, o consentimento não pode ser forçado.
Nesse caso, os juízes franceses concluíram que a Google não havia fornecido informações claras o suficiente para que o consentimento fosse obtido legalmente – inclusive objetando uma caixa de seleção pré-marcada que o tribunal afirmou não atender aos requisitos do GDPR.
As informações sobre operações de processamento para a personalização de anúncios são diluídas em vários documentos e não permitem que o titular de DP esteja ciente de sua extensão. Por exemplo, na seção “Personalização de anúncios”, não é possível estar ciente da pluralidade de serviços, sites e aplicativos envolvidos nessas operações de processamento (pesquisa no Google, Youtube, home do Google, mapas do Google, Playstore, fotos do Google e muitas outras ferramentas) e, portanto, da quantidade de dados tratados e combinados.
O GDPR entrou em vigor em 25 de maio de 2018, na União Europeia, e assumiu as regras europeias de proteção de dados pessoais. Suas multas podem chegar até 4% do faturamento anual de uma organização. Segundo o relator público da audiência, a penalidade representa apenas 0,05% do faturamento da Google e cerca de 1% do faturamento anula desta empresa.
Relembrando os fatos que deram origem a esta sanção, a CNIL recebeu duas reclamações coletivas nos dias 25 e 28 de maio de 2018: uma da associação None Of Your Business (NOYB) e outra da La Quadrature du Net (LQDN) e, a partir daí, começou a investigação para ver se a Google estava ou não de acordo com o GDPR. E, constatou que a Google não respeita alguns princípios fundamentais do arcabouço jurídico-regulatório europeu de proteção de dados pessoais.
Ressalta-se que a Autoridade Irlandesa de Proteção de Dados também continua investigando uma série de reclamações contra a Google, após uma alteração anunciada por ela no que se refere à jurisdição legal de onde processa os dados dos titulares de dados pessoais europeus, movendo-os para a Google Ireland Limited, com sede em Dublin.
O presidente honorário da NOYB, Max Schrems, comentou a decisão:
É muito importante que empresas como o Google não possam simplesmente se declarar ‘irlandesas’ para escapar da supervisão dos reguladores de privacidade.
Max Schrems, NOYB
Já o grupo francês de direitos digitais La Quadrature du Net também declarou vitória, e destacou que:
É a primeira sanção oriunda de várias queixas apresentadas contra gigantes da tecnologia, em nome de 12.000 cidadãos.
La Quadrature du Net
Cabe destacar que recentemente, o escritório de advocacia Boies Schiller & Flexner entrou com uma ação coletiva contra a Google. O processo busca pelo menos US$ 5 bilhões. De acordo com a denúncia apresentada no tribunal federal de San Jose, Califórnia, o Google reúne dados por meio do Google Analytics, Google Ad Manager e outros aplicativos e plug-ins de sites, incluindo aplicativos para smartphones, independentemente de os usuários clicarem em anúncios suportados pelo Google, além da coleta clandestina de informações sobre o que as pessoas veem on-line e onde navegam, apesar de usarem o que o Google chama de modo de navegação anônima.
O Google “não pode continuar se engajando na coleta secreta e não autorizada de dados de praticamente todos os americanos com um computador ou telefone”, afirmou a queixa.
Jose Castaneda, porta-voz da Google, disse que a empresa de Mountain View, na Califórnia, se defenderá vigorosamente contra as alegações.
Como afirmamos claramente cada vez que você abre uma nova guia anônima, os sites podem coletar informações sobre sua atividade de navegação
Jose Castaneda, porta-voz da Google
O processo Brown e outros contra Google LLC e outros, corre no Tribunal Distrital dos EUA, Distrito Norte da Califórnia, sob o nº 20-03664.
Referêncais Bibliográficas
1BUSINESSWORLD. French court slaps down Google’s appeal against $57M GDPR fine. Disponível em: <https://1businessworld.com/tag/digital-rights/>. Acesso em: 20 jun. 2020.
TECH CRUNCH. French court slaps down Google’s appeal against $57M GDPR fine. Disponível em: <https://techcrunch.com/2020/06/19/french-court-slaps-down-googles-appeal-against-57m-gdpr-fine/>. Acesso em: 20 jun. 2020.
CNN BRASIL. Tribunal francês confirma multa ao Google por violação de privacidade. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/06/19/tribunal-frances-confirma-multa-ao-google-por-violacao-de-privacidade>. Acesso em: 20 jun. 2020.
ONE TRUS DATA GUIDANCE. France: Conseil d’Etat rejects Google’s appeal against CNIL’s €50M fine. Disponível em: <https://www.dataguidance.com/news/france-conseil-detat-rejects-googles-appeal-against-cnils-%E2%82%AC50m-fine>. Acesso em: 20 jun. 2020.
CNIL. The CNIL’s restricted committee imposes a financial penalty of 50 Million euros against GOOGLE LLC. Disponível em: <https://www.cnil.fr/en/cnils-restricted-committee-imposes-financial-penalty-50-million-euros-against-google-llc>. Acesso em: 20 jun. 2020.
REUTERS. Google faces $5 billion lawsuit in U.S. for tracking ‘private’ internet use. Disponível em: <https://www.reuters.com/article/us-alphabet-google-privacy-lawsuit/google-faces-5-billion-lawsuit-in-us-for-tracking-private-internet-use-idUSKBN23933H>. Acesso em: 20 jun. 2020.